O tribunal do ódio

Em recente atividade do “Lacan na Academia”, da Seção Minas da EBP, recebemos o escritor Michel Laub para conversarmos sobre seu último livro O Tribunal da quinta-feira. Essa conversa teve lugar na Academia Mineira de Letras, foi coordenada por Laura Rubião e teve como debatedores Ana Lydia Santiago e Henri Kaufmanner.

O Tribunal da quinta-feira de Michel Laub, é daqueles livros que deixa o leitor desconcertado desde o primeiro instante. A história gira em torno do julgamento do publicitário José Victor, causado pelo vazamento do conteúdo de conversas que este manteve por mais de 25 anos com um amigo homossexual. Era ali que os dois mantinham uma livre correspondência sobre sexo, drogas, traições, piadas chulas, segredos e um léxico particular. O espaço virtual era onde podiam gozar e falar da fantasia e do desejo sem censura. No entanto, o que se percebe que é onde pode ser tribunal também.

Durante a narrativa fica clara essa dupla condição do virtual: espaço de gozo ou, ou sua contrapartida, de censura e linchamento. O escritor convida o leitor a ser parceiro ou algoz do personagem. A causa do julgamento é o descobrimento por parte de Teca, ex-mulher de José Victor, das mensagens de e-mail com Walter. Será ali onde ficará sabendo da traição do ex-marido com a secretária vinte anos mais nova, dos comentários impiedosos sobre ela, sua família e, do fato de Walter ser soropositivo. A esposa traída, tomada pelo ódio – quase poderíamos chamá-la de Medéia – resolve compartilhar essas mensagens, a coisa viraliza e, dessa forma, o tribunal se monta transformando ao mesmo tempo José Victor, em réu e vítima.

Em relação a essa dupla função do tribunal, Ana Lydia pergunta se a intolerância poderia ser um dos nomes do ódio no livro. Importante lembrar que como a relação sexual não existe, os sujeitos têm que cifrar esse encontro. O que o livro de Laub mostra é justamente essa falha na cifração, então, como pensar as relações do amor?

Essas são questões interessantes para se pensar na nossa contemporaneidade em que a rede social desvela o gozo em cada um, mas também o judicializa. Como Henri bem lembrou: o ódio é ódio de si mesmo.

Luciana Silviano Brandão (EBP/AMP)