Se você carrega as mochilas de seus filhos quando saem do colégio, cuidado!, poderá entrar em uma nova categoria: os hiperpais, temidos por professores e pedagogos, são aqueles que organizam até o último detalhe a vida de seus filhos e não lhes dão a opção de defenderem-se por si mesmos.
Mas, além do pequeno detalhe da mochila, como poderíamos reconhecer se pertencemos a esse grupo? A jornalista Eva Millet define perfeitamente em seu mais recente livro:[2] os hiperpais falam no plural quando se referem às coisas de seus filhos (“Hoje temos a prova de matemática”), estão obcecados para que recebam a melhor educação (se possível, precocemente) no melhor colégio ou universidade, discutem constantemente as posições de professores e educadores, planejam inúmeras atividades extracurriculares e, no entanto, não permitem que seus filhos participem das tarefas domésticas nem assumam obrigações básicas como arrumar a cama ou pôr a mesa.
Pais cuidadores
Eles são os pais que agem como motoristas, treinadores, guarda-costas, professores particulares e mordomos… Em suma, estressados, acabam criando filhos sufocados que crescem incapacitados pelo excesso de proteção. As causas, segundo o especialista Carl Honore, podem ser buscadas na “tormenta perfeita resultante da globalização e do aumento da concorrência, que, unidos à insegurança cada vez maior nos locais de trabalho, tornou-nos mais ansiosos com respeito a preparar nossos filhos para a vida adulta”. Em resumo: “hoje queremos dentes perfeitos, um corpo perfeito, as férias e a casa perfeita e, obviamente, filhos perfeitos para completar o quadro”. É ainda preciso acrescentar o estresse do estilo de vida que nos impuseram, que transmitimos a nossos filhos com esse onipresente “corra!”, que nos persegue implacavelmente e faz com que, como explica a pedagoga Cristina Gutiérrez Lestón, “toda esta falta de tempo e de espaço para ‘ser’ gera uma série de deficiências emocionais em muitos meninos e meninas que não sabem como lidar com um grupo de pessoas. Se sentem frágeis e com um monte de medos”.
“A conclusão, dizem, é preocupante: talvez estejamos criando a geração mais frágil e insegura da história”, o que, para Gregorio Luri, filósofo e pedagogo, deveria nos fazer pensar que, acima de tudo, as crianças precisam de pais descontraídos. “É um direito da infância”, diz ele.
Por onde começar
Apesar do alarme, o panorama tem solução. O caminho a seguir é chamado underparenting, ou, em outras palavras, não fazer tudo pelos filhos. Como? No livro, a especialista sugere algumas chaves, iniciando com a mochila. “Você não tem de carregar sistematicamente as coisas. Parece insignificante, mas fazer com que eles carreguem sua própria mochila é uma forma eficaz de educar a responsabilidade”.
Também sugere que não se permita que os filhos interrompam as conversas, e que não lhes perguntemos sistematicamente tudo (desde se querem comer até qual medicação para febre preferem tomar). A linha a seguir é definida como “desatenção saudável”, sem antecipar todo tipo de contratempo nem passar o dia todo em torno das criança, ao contrário, intervir minimamente. Na lista de recomendações há outras muito curiosas e concretas, como não falar no plural e não passar o dia postando fotos das crianças em redes sociais. “Esta avalanche, não só está matando a espontaneidade da criança, mas também criando pequenos narcisos”.
Outro aspecto importante é a educação. Aqui a especialista é clara: “a educação não é apenas adquirir títulos. Que o seu filho ou filha seja capaz de agradecer e de encarar uma frustração também é parte fundamental de sua formação”. Além disso, é importante, não interferir demais nas decisões da escola e procurar que a criança aprenda a assumir seus próprios erros.
Relaxe, sem medo
Mas o que é o que nos impede de soltar a mão de nossos filhos? Por que os superprotegemos chegando, muitas vezes, a beirar o ridículo? Seria algo tão humano como o medo. “Medo de nos equivocar, explica a autora, de dizer ‘não’, de traumatizá-los, de não dar tudo o que acreditam que eles mereçam, de não conseguirem ser felizes, de sofrer. Inclusive de não conseguir esses filhos perfeitos que hoje parece que todos devem ter”. A receita para superá-lo é relaxar e desfrutar de serem pais, para que eles também desfrutem de serem filhos. “Meu conselho é que sejam afetuosos com seus filhos, que estejam com eles quando precisarem, mas não ficar em cima deles durante todo o dia. Que não fiquem nervosos porque o filho do vizinho está aprendendo chinês e que, de acordo com seus pais, seja uma criatura que beira a perfeição”. Há que dizer não, exigir que colaborem e também “dizer-lhes que nós os amamos, mas que isso não equivale a ter uma série de direitos adquiridos sobre você ou sobre o resto do mundo”.