Hoje o assunto é segredo! Alejandro Reinoso destaca que um segredo de família é o que introduz uma descontinuidade no sentido familiar, “um sem sentido que remete a não relação sexual”. Portanto, não há família sem um segredo.

O sentido familiar é, segundo Lacan, o “sentimento, que cada um tem, de fazer parte de seu mundo, quer dizer, de sua familiazinha e de tudo que gira ao redor”, como afirma Lacan. Tal citação do Seminário 20, Mais, Ainda (p. 48) é comentada neste número por três colegas. Celeste Viñal destaca a função de centralidade da família para o neurótico que, ao mesmo tempo que lhe outorga um pertencer/ser, o condena a girar em torno dessa ficção. Ao mesmo tempo, é na família, seja ela qual for, que se dá o encontro do parlêtre com lalange, observa Blanca Sánchez afirmando que “não há parlêtre sem família”. A análise é o que permite introduzir variações nessa ficção e, como aponta Silvia Bermúdez, a verdadeira revolução é quando conseguimos nos desprender desse sentido e deixamos de girar em falso. Silvia De Luca demonstra, a partir da clínica, como um sujeito se vira para enodar o feminino, cerne de todo segredo de família, na época em que o sentido familiar não se fixa mais pela orientação ao pai.

O que é uma família? Um pai, uma mãe, um filho e um irmão? Essas posições continuam sendo orientadas pelo falo e pela castração? Para desvendar esses segredos Graciela Musachi em entrevista à Ludmila Malischevski nos convida a pensar se as operações que outrora nos orientavam nesse campo, ainda nos servem.

Na apresentação do livro Transformaciones. Ley, diversidad, sexuación, Alejandra Antuña y Graciela Schnitzer em entrevista a Paula Szabo e Liliana Zaremsky, nos contam a longa história desta publicação que se iniciou em 2001 com a criação do departamento Enlaces e do módulo de trabalho “O sexo e suas representações”, e ganhou impulso em 2010 com a promulgação da lei do matrimonio igualitário e da lei de identidade de gênero. A idéia era pensar se uma Lei poderia incidir ou ordenar questões relativas a sexuação. “Tranformaciones” revela que no fundo dos discursos sobre gênero há um enorme rechaço do inconsciente que sustenta a ideia de que a escolha do sexo é uma opção que o sujeito faz livremente.

Finalmente, entre uma revelação e outra, o segredo que recobre o enigma do gozo feminino resiste e insiste em nos fazer girar.

Boa leitura!

Cynthia Nunes de Freitas Farias (EBP)

A familia: ¿revolução? ¿rotina?

“A revolução copernicana não é de modo algum uma revolução. Se o centro de uma esfera é suposto, num discurso que é apenas analógico, constituir o ponto chave, o fato de trocar esse ponto, de fazê-lo ser ocupado pela terra ou pelo sol, não tem nada em si que subverta o que o significante centro conserva por si mesmo. Longe de o homem – o que se designa – ter sido jamais sacudido pela descoberta de que a terra não esta no centro, ele a substitui muitíssimo bem pelo sol. Está claro que agora é evidente que o sol não é, também ele, um centro, e que ele passeia através do espaço, cujo estatuto é cada vez mais precário de estabelecer. O que resta no centro é essa boa rotina que faz com que o significado guarde, no fim das contas, sempre o mesmo sentido. Esse sentido é dado pelo sentimento, que cada um tem, de fazer parte de seu mundo, quer dizer, de sua familiazinha e de tudo que gira ao redor”.

LACAN, Jacques. O seminário, livro 20: mais, ainda (1972-1973). Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985, p. 58.