Sobre “Amores Brutos” de Alejandro González Iñárritu²
Lorena Greñas (NEL)

Amores brutos (México, 2000) inicia a chamada “trilogia da morte”, de Alejandro Gonzáles Iñárritu, em que um ambiente opressor, carências que atravessam as classes sociais e diversas transgressões instigam o desdobramento de paixões humanas nas quais o ódio tem um lugar preponderante e culmina em diferentes formas de violência.

“…Lembre-se de que todo dono se parece com seu cão”. El Chivo.

Alinhado com o argumento do IX ENAPOL³, o desenvolvimento das três histórias que compõem o filme transmite a precariedade dos laços como consequência do declínio do Nome-do-Pai e seu correlato, o imperativo de gozo feroz e obsceno, como as brigas de cães mostradas. Homo homini lupus!… Freud ressoa nas palavras do roteirista Guillermo Arriaga quando este diz: “O filme é uma visão do ser humano […] eu acredito que o ser humano é muito paradoxal e tem uma bestialidade à flor da pele. Só é preciso coçar um pouquinho, por isso a analogia com os cães”⁴.

O encontro com o real – uma batida entre dois automóveis – muda radicalmente a vida dos seus protagonistas e constitui o acontecimento nodal que enlaça as histórias paralelas.

A luta por causa de Susana entre Octávio e Ramiro dá conta do ódio como desejo de morte do rival no amor. É a mesma paixão que subjaz no conflito fraterno entre Luis e Gustavo. Para Valéria e Daniel, o projeto de uma vida em comum “feliz” se vê truncado pelo acidente… da mesma forma que a perna dela. Os pinos não se encaixam mais nos buraquinhos e a cólera faz sua emergência.

Para Valéria e Daniel, o projeto de uma vida em comum “feliz” se vê truncado pelo acidente… da mesma forma que a perna dela. Os pinos não se encaixam mais nos buraquinhos e a cólera faz sua emergência.

A escolha de Chivo, que vivia do lixo, sendo ele mesmo um rebotalho humano, permite-lhe recuperar sua dignidade e seu nome: Martín.

Os desafios que o ódio, a cólera e a indignação colocam para a psicanálise são ilustrados em uma cena perto do final. Chivo diz a Luis e a Gustavo: “Deixo vocês em suas casas e tomara que possam ajeitar suas diferenças […] ora, se não se entendem falando, deixo-lhes isto [uma pistola], para que se compreendam melhor”. Como manejar, então, para que a palavra recupere seu poder?

Tradução: Glacy Gorski
Revisão: Paola Salinas


Notas

¹ N. T.: Ditado popular, em espanhol. Segundo https://cvc.cervantes.es/lengua/refranero/ficha.aspx?Par=59279&Lng=0 significa que “não é preciso mostrar ou ensinar tudo, já que de um exemplo é possível deduzir facilmente tudo aquilo que ainda é preciso descobrir”.

² IÑÁRRITU, A. G. Amores brutos. Filme. México. 2.000.

³ IX ENAPOL. Argumento. “Ódio, Cólera, Indignação. Desafios para a psicanálise” https://ix.enapol.org/es/argumento-2/

⁴ Análise Semiótica de Amores brutos. Entrevista a Guillermo Arriaga. Evitemos banalizar a violência no cinema e na televisão. https://www.academia.edu/9918094/Análisis_Semiótico_Amores_Perros