Sobre “Campo Minado” de Lola Arias²
Manuel Zlotnik (EOL)

“Campo minado” é uma performance na qual seis ex-combatentes das Malvinas relatam sua experiência durante a guerra, de seu início ao fim.

A originalidade dessa performance está no fato de que, dos seis ex-combatentes, três são argentinos, dois são ingleses e um é um gurkha. Cada um dos protagonistas nos vai relatando como vivem, em sua singularidade, a guerra, desde como foram recrutados e como processaram o trauma até o final dos vencedores e vencidos.

Há claramente a presença do ódio enquanto expulsão do outro. Por um lado, os “sudacas”³; por outro lado, os “imperialistas”: a ilusão é que se matará aquilo que não se suporta do gozo encarnado no outro, e, no relato performativo dos protagonistas, o que se verifica é a impossibilidade de consegui-lo. Isso a obra nos mostra de um modo muito lúcido.

Quando já não podem sustentar seus ideais com dignidade, caídos do Outro, surge a indignação como afeto. Os argentinos, por um lado, abandonados nas mãos de Deus, sem recursos, enquanto as notícias e a euforia diziam o oposto – nesse momento captam a trama sinistra da qual são objeto –, e os ingleses, por outro, representando uma coroa imperial em decadência, dispostos a lutar contra um inimigo que chega vencido de antemão. Quem fica isento da indignação é o gurkha, que não é movido por nenhum tipo de ideal patriótico, é um simples mercenário que cumpre sua função.

É realmente muito interessante essa confrontação 35 anos depois. Poderíamos dizer que é uma confrontação sublimada em uma espécie de expressão artística, mas ainda assim continua sendo uma confrontação, enquanto argentinos e ingleses mantêm suas posições contrárias. Só que isso não os leva à luta até a morte no real, mas a uma disputa que agora se dá em uma performance artística.

Poderíamos localizar uma passagem de ódio à indignação e à obra, que finalmente permite restituir certa dignidade da singularidade de cada um dos protagonistas.

Como mensagem final, ficamos com a de que a guerra é o pior, mas não aponta um ideal ingênuo de paz e amor, no qual o pulsional não existe. Melhor dito, a mensagem de “Campo minado” é a de que a pulsão de morte é ineliminável; que a guerra, sim, é a pior forma de tratá-la; e a performance, ao contrário, nos mostra outro modo, muito mais dialético e sublimado, respeitando o modo sintomático de cada um.

Tradução: Flávia Machado Seidinger Leibovitz

Revisão: Paola Salinas


Notas

¹ N. A.: Título da obra de Pablo Suarez (1982), Óleo sobre tela, coleção particular.

² ARIAS, Lola. “Campo Minado”.leia mais

³ N. T.: optamos por conservar o termo “sudaca”, alusão a “sudamericanos”, por não ter correspondente no português que mantenha sua conotação pejorativa, transmitida pelo autor quando ao tratar de ódio, cólera e indignação, mantém o termo em seu aspecto depreciativo utilizado na Espanha para referir-se a sul americanos ou latino-americanos; termo também utilizado como insulto, para atribuir inferioridade ou incapacidade a alguém.